segunda-feira, 10 de setembro de 2012

A IGREJA MATRIZ DE SÃO JOSÉ DE MACAPÁ



                                                             

 A IGREJA MATRIZ DE SÃO JOSÉ DE MACAPÁ

                             Por Nilson Montoril

Imagem da Igreja de São José evidenciando as duas passagem que levavam ao Largo dos Inocentes. À esquerda do templo ainda estava ereto o prédio da Casa Paroquial. No local  deste imóvel foi erguido o primeiro bloco da Prelazia de Macapá. Até hoje, o importante templo inaugurado no dia 6 de março de 1761, ainda não foi tombado pelo IPHAN.

                        Figuro entre as pessoas que preferem usar a palavra templo, para designar a construção onde ocorrem os ofícios religiosos. A palavra igreja, ao tempo de Jesus Cristo, foi utilizada para identificar o conjunto de fieis ligados à mesma fé e sujeitos aos mesmos chefes espirituais. Os gregos chamavam de “ekklesia” as assembléias. Os romanos também adotaram o termo, substituindo as letras k por duas letras c: ecclesia. Quando poucos indivíduos reuniam-se para tratar de assuntos sigilosos, dizia-se que eles estavam fazendo uma igrejinha. Ainda hoje é assim. Foi o próprio Jesus Cristo quem usou a palavra ao se referir a sua comunidade: “lembra-te Pedro que tu és pedra e sobre esta pedra construirei a minha igreja”. Até mesmo algumas seitas protestantes usam a palavra, caso da “Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias”.
Músicos de nacionalidade alemã que integravam a CAMERATA MUSICALE-Freundeskreis der Musikschule Giengen, próximo ao altar-mor, onde fizeram uma bela apresentação na Igreja de São José , dia 17 de maio de 2005 e a dedicaram aos sacerdotes do Pontificio Instituto das Missões Estramgeiras-PIME. Sempre que eles se apresentam em algum lugar, não deixam de fazê-lo em igrejas.(foto do arquivo de  Nilson Montoril Júnior).
                        Nossa pequena cidade de Macapá tem, na igreja de São José, o mais antigo monumento patrimonial da sua história. Mas, a igreja da qual falaremos não foi a primeira a ser erguida na “Província dos Tucujú”. O primeiro templo era bem humilde, tendo um altar de madeira, sobre o qual ficava a imagem de São José, pai putativo de Jesus Cristo. Deve ter sido construída ainda no final do ano de 1751, na área onde está erguida a Fortaleza. Pouco tempo depois, ainda no mesmo local, foi erigido um novo tempo, em taipa, e coberto de palha. A Paróquia de São José de Macapá foi criada em 1752, sendo nomeado como Vigário o Pe. Miguel Ângelo de Moraes, presente no povoado desde novembro de 1751. No dia 4 de fevereiro de 1758, ocasião em que o povoado de Macapá foi elevado à categoria de vila, se deu o lançamento da pedra fundamental de uma nova igreja, no Largo de São Sebastião. A 6 de março de 1751, o templo foi inaugurado. As plantas foram elaboradas pelo Sargento Mor da vila e aprovadas pelo arquiteto italiano Antônio Lande, especialista em cartografia e construções. O aspecto do templo era bem singular. Nas laterais havia uma porta e uma janela alta. A frente do prédio tinha uma porta central de uma só folha. Ao alto, figuravam duas janelas gradeadas com ferro. Ao lado esquerdo do templo se levanta um campanário com uns 15 metros de altura. Em cada face do campanário há um sino. O acesso ao campanário era feito por uma porta posterior à fachada, cujo acesso era feito através da “Passagem Espírito Santo”, existente à esquerda do templo, entre o ele e a Casa Paroquial À direita da Igreja de São José havia a “Passagem Santo Antônio”, separando a casa de orações do prédio do Senado da Câmara. A escada que leva ao piso onde são luxadas as cordas dos sinos é de madeira. Conforme a planta da Vila de São de São José de Macapá, traçada em 1761, pelo Capitão Engenheiro João Geraldo Gronsfeld, a igreja tem a frente para a Rua São José. O fundo demanda para o “Largo dos Inocentes”, cortado por uma estreita via denominada “Rua dos Inocentes”. Os moradores do Largo dos Inocentes usavam as passagens Espírito Santo e Santo Antônio para terem acesso ao Largo de São Sebastião, posteriormente Largo da Matriz, e a outros logradouros do burgo. Até o inicio da década de 1980, carros e outras viaturas trafegavam pelas duas passagens. Para evitar danos à igreja, o poder público autorizou a então Prelazia de Macapá a fechar, com grades de ferro, a Passagem Santo Antônio, permitindo que os padres se movimentassem com tranqüilidade entre a Sacristia e o imóvel onde residiam. Por ocasião da ampla reforma pela qual passou a Biblioteca Elcy Rodrigues Lacerda, erguida na área do velho Senado da Câmara, a largura da Passagem Santo Antônio foi drasticamente reduzida. 

Prédio do antigo Senado da Câmara, onde também funcionoram: a Escola Pública de Macapá, uma Farmácia instalada pelo Padre Júlio Maria Lombaerd, a Unidade Mista de Saúde do Território do Amapá, o Palácio do Governo, a 1ª Central Telefônica do Território do Amapá e a Escola Técnica de Comércio do Amapá, que foi encampada pelo governo do General Ivanhoé Gonçalves Martins e passou a funcionar como Escola Comercial do Amapá-CCA. Este imóvel, por ser irrecuperável, foi demolido em 1970. No local foi construida a sede da  Biblioteca Pública Elcy Rodrigues Lacerda, bem diferente da atual.

As alterações feitas no contorno da igreja foram amplamente aprovadas pela população, haja vista que o barulho produzido por veículos automotores e indivíduos contrários ao catolicismo perturbavam as orações, as missas, as novenas, as celebrações de casamentos e a ministração do batismo e crisma. A coberta da igreja sempre foi de telha de barro, com um considerável beiral que protegia as paredes. Há informes de que suas características do estilo arquitetônico inaciano foram sendo modificadas com as reformas introduzidas. A reforma mais expressiva, feita antes da chegada dos padres italianos, é mérito do sacerdote francês François Rellier, no inicio do século dezenove. O registro descritivo mais rico em detalhes é obra do Padre Júlio Maria Lombaerd, que desembarcou em Macapá a 27 de fevereiro de 1913, egresso de Belém. Além de descrever aspectos da cidade, Padre Júlio fala da igreja: “Da cidade baixa, fomos para a cidade alta, construída na planície. Primeiramente chegamos a uma grande praça, de mais de dois hectares de superfície. É a Praça da Matriz. E, realmente, na nossa frente, do lado oposto da praça, ergue-se solene, quase majestosa, uma grande igreja de pedra. Destaca-se no meio de tudo que a cerca. De construção regular, coberta de telhas francesas, com uma torre ao lado, como todas as igrejas brasileiras, tem um tríplice pórtico, encimado de três belas janelas com vidro. Uma escultura simples, mas de bom gosto. Termina com o pinhão que serve de base para uma cruz branca, dando ao conjunto um toque de esperança e de futuro. Um pavimento ladrilhado, à maneira européia, forma diante do pórtico, uma bela plataforma que termina de cada lado, com uma coluna de madeira com lâmpadas para iluminação”.

A imagem de São Bebedito figurou por muito tempo  no altar localizado à esquerda de quem entra na Igreja São José, hoje ocupado pela imagem do Sagrado Coração de Jesus. Protetor da comunidade negra de Macapá, atualmente tem sua própria igreja, no Laguinho.

                        Observa-se que, nos termos da narrativa do Padre Júlio Maria Lombaerd, na fachada da igreja já existiam três portas, três janelas com vidros e pinhões no frontispício. São detalhes arquitetônicos que passaram a figurar após as reformas feitas por iniciativa do Padre Rellier. A iluminação das ruas e travessas de Macapá era a querosene, havendo um servidor municipal que acendia e apagava as luminárias. Voltemos às narrações do Padre Júlio Maria Lombaerd: “Entrando no Santuário, onde não pude conter uma exclamação – Que igreja bonita! E de fato, é uma das mais belas que encontrei, até agora, nesta terra brasileira. É simples e muito e muito simples mesmo e, por conseguinte, sem pormenores arquitetônicos; mas esta simplicidade lhe comunica algo de majestoso, quase misterioso. Tendo apenas uma nave central, sem as laterais, permite-nos vê-la, no conjunto, com o primeiro relance de olhos e avaliar suas dimensões. A nave, da porta de entrada até a mesa de comunhão, mede 22 metros de comprimento por 11 de largura. A estrutura é regular e sem saliências. As paredes são brancas; o piso é de ladrilhos de cimento, com desenhos variados e três divisões com imitação mosaica, marcando a linha média da nave. O altar-mor está bem acima do piso, com seis grandes degraus. De cada lado do altar estão dois outros altares, do mesmo modelo, porém menores. Um tem, na última banqueta, a imagem do Sagrado Coração de Jesus; o outro a de Santo Antônio, mas, na banqueta principal está a imagem de São José, o padroeira da igreja. O coro é separado do corpo da igreja por uma magnífica mesa de comunhão de ferro fundido. Nesta parte, o corpo da igreja se estreita de maneira a deixar bastante espaço, a cada lado da mesa de comunhão, para dois altares; um consagrado a São Benedito, e outro, a Nossa Senhora, ou antes, a um grupo de Santas Virgens. Há umas três ou quatro imagens destas Virgens, todas bem estragadas; umas mais do que as outras – carcomidas, quebradas. A uma falta mão; á outra braços. São todas pintadas de cores berrantes, quase ridículas.
                        Do lado do Evangelho está um lindo púlpito esculpido em cedro. No meio da igreja há dois altares laterais, um em frente ao outro. Um consagrado não sei a qual santo, porque há as imagens de São Miguel, São Vicente de Paulo, São Raimundo Nonato, São José e São Tomé, etc. Uma coleção de antiguidades. O do outro lado é consagrado à Sagrada Família. Ao entrar na igreja, o fiel podia ver dois altares separados por uma linda grade de ferro fundido. Um é o altar – túmulo (à direita), com a imagem do Salvador no sepulcro. É encimado pela imagem de Jesus carregando a cruz. Do outro lado está o batistério”.

A Sabrada Família, constituida por Maria, José e Jesus. Consta que, a intrudução da imagem na Igreja de São José, antecedeu a vinda dos padres da Congregação da Sagrada Família, que atuaram nas terras do Amapá entre os anos de 1911 a 1948. O famoso Padre Júlio Maria de Lombaerd  foi o segundo integrante da ordem a se estabelecer em Macapá.
                        A partir do segundo semestre de 1948, outras modificações aconteceriam. Presentes nas terras do Amapá desde 1911, os Padres da Congregação da Sagrada Família a deixaram em junho de 1948, repassando ao Pontifício Instituto das Missões Estrangeiras a missão evangelizadora que haviam recebido em 1911. Os sacramentinos foram substituídos pelos sacerdotes italianos. Os dois primeiros, Aristides Piróvano e Arcângelo Cerqua, chegaram dia 29/5/1948. No dia 25 de junho de 1948, chegavam a Macapá, por via fluvial, os padres Luiz Viganó, Mário Limonta, Lino Simonelli, Carlos Bassanini e Vitório Galliani. Mestre em restaurações, o Padre Mário Limonta ficou encarregado de reformar a igreja e a casa paroquial.
Arcângelo Miguel, responsável pela eterna vigilância a Lúcifer, aqui aparece com espada na mão direita, uma balança na mão esquerda e o pé esquerdo sobre a  cabeça do diabo forçando-o a retornar ao inferno. São Miguel também tem a incumbência de pesar os pecados das almas que retornam ao Criador, daí a balança estar simbolicamente retratada na gravura. Segundo o Apocalipse, livro escrito pelo apóstolo João Evangelista, o Arcângelo Miguel e Lúcifer só travarão a batalha final, nominada Batalha Celeste, no dia em que comandará a guerra do fim do mundo. 

 No fundo do templo, foi modificado o altar central, permanecendo nele a imagem de São José. Nos altares ao lado, as imagens do Sagrado Coração de Jesus e a de Santo Antônio de Lisboa cederam espaço para dois belos painéis pintado pelo Pe. Lino Simonelli. À esquerda, cena da Sagrada Família fugindo para o Egito. À direita, a Sagrada Família foi retratada trabalhando na oficina de carpintaria de São José. A Imagem do Sagrado Coração passou a ocupar o altar onde ficava a imagem de São Benedito, à esquerda da mesa de Comunhão.
São Vicente de Paulo. Em Macapá ainda funciona uma associação que presta auxilio às pessoas necessitadas, inclusive com a distribuição do Pão de Santo Antônio.

 À direita, saíram as Santas Virgens, colocando-se na banqueta a Imagem de Nossa Senhora do Rosário. Os altares laterais da nave principal foram eliminados. O púlpito permaneceu recebendo melhoramentos. A mesa de comunhão de ferro fundido foi retirada e substituída por outra de alvenaria. A igreja foi pintada por dentro e por fora.
Gravura de São Raimundo Nonato. Na localidade de São Pedro dos Bois, municipio de Macapá, os moradores lhe prestam homenagens no dia 31 de agosto.

Nas laterais foram abertas três portas de cada lado e fechadas as janelas. Posteriormente, em decorrência das decisões do Concílio Vaticano II, a mesa de comunhão deixou de existir, retirou-se o púlpito, o batistério e os bancos próximos ao altar principal. Os padres passaram a celebrar a missa em português e de frente para os fieis. Com o advento da nova catedral, surgiu a idéia de transformar a velha igreja no Santuário de São José, com a reinstalação dos pormenores de outras épocas.  
Gravura que mostra o apóstolo Tomé examinando e tocando na chaga existente no flanco direito de Jesus Cristo. Tido como incrédulo, porque duvidou que Jesus tivesse ressucitado, disse que só acreditaria que o Divino Mestre havia vencido a morte se o visse e tocasse suas feridas.

                        Observa-se no interior da igreja que há várias pedras tumulares indicando o local onde teriam sido sepultadas pessoas gradas da comunidade macapaense. Essas lápides estão assentadas no piso e nas paredes, mas acredita-se que nenhum sepultamento foi realizado no interior do templo. A colocação de uma lápide dependia da atuação do morto no dia a dia da religião que professava, do status que o falecido e sua família ostentavam na cidade.O poder aquisitivo dos familiares também era vital para a obtenção da licenca para a colocação das chamadas “lápides de penitência” ou “lápides de lembrança”. Os corpos das pessoas mencionadas nas lápides da igreja teriam sido sepultados no Cemitério Nossa Senhora da Conceição.   
 
Esta gravura das Santas Virgens é semelhante as imagens que existiam no altar onde atualmente está a imagem de  Nossa Senhora do Rosário. As santas representadas no quadro acima são as irmãs Ágape, Irene e Quilônia, martirizadas por ordem de Dulcério, governador da Macedônia.Àgape e Quilônia foram queimadas vivas. Irene morreu em óleo fervente.
 

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