terça-feira, 7 de maio de 2013

DISPENSÁRIO DOS TUBERCULOSOS





                           DISPENSÁRIO DOS TUBERCULOSOS

                                                                     Nilson Montoril

Nessa fotografia vemos o Hospital Geral de Macapá, ainda com dois pavimentos, a Maternidade e,ao fundo, o Dispensário dos Tuberculosos. Na frente do HGM havia uma simples pracinha e arborização feita com jambeiros. Na área em primeiro plano, que atualmente abriga a direção da Secretaria de Saúde só prevalecia um gramado.Note que o Dispensário dos Tuberculosos era isolado.Também restrito aos doentes e profissionais da saúde. Nos dias de visita, as crianças não tinham contato pessoal com os doentes. Os pais só viam seus filhos de longe.Atualmente o prédio ainda existe.
                        A tuberculose pulmonar, infecção causada por um microorganismo chamado Mycobaterium tuberculosis ou bacilo de Koch ocorre em todo o mundo, sendo mais comum nos países pobres, promíscuos, desnutridos, má condição de higiene e saúde pública deficiente. As maiores incidências são registradas na Índia, China, Indonésia, Bangladesh, Nigéria, Paquistão, Filipinas, Congo, Rússia e Brasil. A Organização Mundial da Saúde calcula a existência de oito milhões de novos casos. Antigamente a tuberculose era chamada peste cinzenta, tísica pulmonar ou doença do peito. Também foi denominada de peste branca devido à palidez da pele contratando com a cor rósea dos pômulos durante o acesso febril. A tuberculose aparece entre os dez maiores problemas de saúde pública em relação à morbidade tanto nos países desenvolvidos quanto nos em desenvolvimento. No tocante à mortalidade, a tuberculose fica entre a 1ª e a 3ª causa entre as doenças transmissíveis nos países desenvolvidos. Estima-se que ela exista há mais de 50 mil anos. No século V antes de Cristo, Hipócrates se referiu à tuberculose afirmando no livro Epidemias I, em detalhes: “Não conheço um só caso que tivesse de permanecer no leito e que sobrevivesse por algum tempo”. Areteu, que viveu em Roma de 81 a 138 depois de Cristo, também descreveu a doença, deixando evidente que ela era freqüente no Império Romano. A primeira descrição do termo tuberculose ou parênquima pulmonar se deve a Francisco La Boe em 1679. A doença só começou a declinar depois que Villemin constatou sua contagiosidade em 1868, de Thomaz Koch ter identificado o Mycobacterium tuberculosis em 1882 e Waksman haver descoberto o antibiótico com ação sobre o bacilo, a estreptomicina em 1944. O tratamento inicial da tuberculose pulmonar chama-se RHZ com rifampicana(R), isoniazida(H) e pirazinamida(Z), dura seis meses e pode alcançar até 100% de cura. O diagnóstico é feito a partir da abreugrafia, baciloscopia do escarro e PPD.

O cartaz acima ilustra como o doente de tuberculose expele o bacilo de Koch após uma crise de tosse. O risco de contaminação de uma pessoa sadia é muito grande se ela estiver perto do tisico. O contágio ocorre quando uma pessoa aspira o bacilo que se propaga pelo art opu quando goticulas o atingem.

 O primeiro forte sinal de que alguém pode estar contaminado é uma tosse forte e impertinente que causa muito sofrimento ao doente e transtornos aos que se encontram a seu lado. A tísica, portanto, se deve a uma ulceração do pulmão e costuma apresentar-se depois de uma tosse prolongada ou hemoptise, febre continua, principalmente à noite. Também se fez uso do termo consunção como identificatório da doença. Graças ao biólogo frances Albert Calmette, que viveu entre 1863 a 1933, o tratamento da tuberculose passou a contar com a eficiente vacina BCG. Foi iniciativa sua a fundação do primeiro dispensário antituberculose na França. O dispensário corresponde a um estabelecimento de beneficência destinado ao tratamento gratuito de enfermos pobres e serve para dar-lhes a assistência devida. O paciente era apartado da família porque se acreditava que a simples convivência de uma pessoa sadia com um tísico a levaria a contrair o mal. Isso não deixa de ser verdade, desde que a pessoa sã não tome os devidos cuidados e faça regularmente exames clínicos. Atualmente sabe-se que a tuberculose não se contrai pelo sexo ou pelo sangue contaminado. Por isso, já não é tão necessário separar copo, prato, talheres ou outros utensílios de uso comum no seio de uma família. A tuberculose atinge os pulmões, as meninges, ossos, rins, coração e outros órgãos. Só a tuberculose pulmonar é transmitida de uma pessoa que tenha o bacilo de Koch a outra. Isso ocorre quando o doente tosse e espirra eliminando o bacilo e através do ar ele é aspirado por quem não possui o mal.
A mensagem contida no cartaz diz: "Tosse há mais de 2 semanas pode ser tuberculose. Faça o exame de escarro." Aliás, não apenas o individua acometido de tosse braba deve realizar o exame. Seus familiares também precisam ter precaução.

 A palavra tísica usada antes da prevalência do termo tuberculose é uma das mais antigas da medicina. Provem do grego phthsis e deriva do verbo phthiso, com o sentido de decair, consumir, definhar. A doença é milenar ou mesmo da pré-história, tendo sido identificada em múmias egípcias datadas de mais de 3.000 anos. Múmias da dinastia de Ramsés, no Egito, apresentam tuberculose óssea, notadamente na coluna vertebral. O médico grego Cláudio Galeno, na Itália, dizia que a doença era incurável e aconselhava isolar os enfermos. Recomendava repouso, ar puro e boa alimentação. No Brasil, os dispensários tornaram-se bastante comuns entre as capitais do Brasil a partir do inicio do século XIX. Entretanto, o combate à tuberculose foi iniciado no país pela Liga Brasileira Contra a Tuberculose, fundada no Rio de Janeiro no dia 4 de agosto de 1900. Era uma instituição filantrópica destinada a prestar assistência médico-social aos doentes de tuberculose e disseminar informações sobre a doença.

Doentes iguais ao paciente que aparece nessa fotografia eu vi bastante na Macapá das décadas de 1950 e 1960. Alguns precisavam trabalhar para promover o sustento da familia e por isso evitavam se submeter a exames médicos. Quando eles eram fustigados pela intensa tosse, própria dos tisicos, tinha-se a impressão de que, a qualquer momento, poderiam morrer ou ter um ataque de hemoptise. Se o cabeça de casal fosse internado, o governo territorial prestava ajuda à sua família. Diversos tisicos não perdiam o pernicioso hábito de fumar e beber, o que complicava ainda mais seu drama.
 No dia 26 de janeiro de 1902, essa instituição criou seu primeiro dispensário, cuja inauguração aconteceu em 1907. Depois dela, outras Ligas Contra a Tuberculose surgiram e foram muito importantes, notadamente a partir de 1927, ano em que foi instituída no Brasil a vacinação BCG. Outros órgãos como a Inspetoria de Profilaxia da Tuberculose (1920), Serviço Nacional de Tuberculose (1940) e Campanha Nacional Contra a Tuberculose (1946) também atuaram para erradicar a doença. Quando o governo do Território Federal do Amapá pleiteou recursos federais para construir o Hospital Geral de Macapá, fez incluir no projeto uma maternidade, uma unidade de atendimento materno infantil e um dispensário dos tuberculosos. Tratava-se na verdade de um complexo hospitalar que ainda hoje serve de base para as ações de saúde pública desenvolvidas na capital do Estado do Amapá. O prédio destinado ao Dispensário dos Tuberculosos tinha a frente para a Rua Jovino Albuquerque Dinoá e fundo para a área interna do HGM. Na época de sua inauguração não havia tráfego de veículos além da atual Avenida Duque de Caxias, então um singular caminho. Os doentes eram internados por seis meses e submetidos a rigoroso tratamento. Os tuberculosos cujo estágio da doença merecia tratamento mais especializado eram mandados para o Hospital dos Servidores Públicos na cidade do Rio de Janeiro, então capital da República dos Estados Unidos do Brasil.

 Antes da inauguração do Hospital Geral de Macapá, as ações de saúde pública do governo territorial eram realizadas pela Unidade Mista de Saúde instalada em um velho casarão erguido onde hoje está o prédio da Biblioteca Elcy Rodrigues Lacerda. Lembro de várias pessoas que tinham tuberculose e passaram por tratamento em Macapá e no Rio de Janeiro. A maioria era bem carente, corpo franzino, tosse perturbadora e cansaço intenso. Vários doentes vieram da região da Ilhas do Pará, onde viviam sem qualquer assistência médica e entregues à própria sorte. Tísicos de Macapá residiam em casas humildes, desprovidas do conforto e higiene mínima necessária. As habitações eram quase todas de taipa, geminadas, cobertas de palha de ubuçu, sem janelas laterais e piso de terra batida. Raros eram os citadinos que usavam tamancos, alpercatas ou chinelos de borracha. Eu e meus amigos de infância convivíamos com os filhos dos doentes e eramos orientados a não ficar perto do tísico quando ele estivesse tossindo ou espirando. Também não deveríamos tomar água no único copo ou caneco que a família usava e ficava sempre perto do pote ou da bilha. Em várias casas os utensílios comum para beber água eram latas vazias de leite moça. Diziam os mais velhos que a contaminação ocorreria pelo uso comum de colheres, copos e pratos que também eram utilizados pelo doente. Outro cuidado redobrado era não pisar no cuspe ou escarro de um tísico. Por incrível que pareça, muitos tísicos não acreditavam na medicina para curar seus males.Mantinham o condenavel vicio de fumar e consumir cachaça. Alimentavam-se precariamente, razão pela qual acabaram morrendo praticamente sem assistência médica.
O famoso compositor Noel Rosa desponta como uma das celebridades brasileiras que foram atingidas pela tuberculose. Boêmio e fumante , o "Doutor do Samba"vivia com o cigarro na boca e acabou morreu ainda novo.


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